Avaliações de imóveis para fins distintos poderão concluir valores distintos?

Introdução

No que respeita aos resultados obtidos num processo de avaliação de imóveis, uma questão que por vezes surge é quando existe uma discrepância de valor dependendo de ter sido elaborada para fins de boa garantia hipotecária, para efeitos de partilhas, para efeitos de registo contabilístico, etc.

Normalmente os valores são idênticos, mas podem surgir algumas situações em que os resultados nem sempre são coincidentes.

Existe legislação nacional e normativo internacional que indicam a forma de abordagem e as metodologias a adotar para avaliação de imóveis (RICS, EVS, CMVM, Lei n.º 153/2015, entre outras)

Neste artigo, imergiremos nas razões subjacentes a algumas dessas possíveis discrepâncias e as implicações que as mesmas podem acarretar, focando mais a atenção nas avaliações para efeitos contabilísticos sem, contudo, esgotar o tema.

 

EVS (European Valuation Standards)

A nível Europeu as EVS (European Valuation Standards) incorporaram algumas normas para as avaliações para efeitos contabilísticos e de reporte financeiro (IFRS13) numa visão de “justo valor”.

Existe ainda normativo nacional proveniente do SNC (Sistema Nacional de Contabilidade) que poderá ter aplicabilidade em território nacional (nomeadamente nos imóveis que se consideram propriedade de investimento).

Algumas orientações da IFRS 13 indicam que o “Justo valor” será o preço que seria recebido pela venda de um ativo numa transação ordenada entre participantes no mercado, à data da avaliação (aos olhos do mercado e não do detentor dos imóveis) e representa o preço líquido a receber pelo vendedor e não o preço bruto pago pelo comprador, onde os eventuais custos de transação não devem ser considerados.

A IFRS 13 acrescenta ainda o conceito de “maior e melhor utilização” levando em consideração uma utilização do ativo que seja fisicamente possível, considerando as características físicas do ativo, e que os participantes no mercado considerariam na sua valorização, desde que:

  • Legalmente admissíveis (atendendo a restrições legais à utilização do ativo)
  • Financeiramente viáveis (considerando uma utilização do ativo que seja materialmente exequível e legalmente permitida, para gerar os rendimentos esperados pelos participantes no mercado).

 

A maior e melhor utilização é determinada na perspetiva dos participantes no mercado, numa visão externa, mesmo que a entidade atualmente detentora tenha um objeto social específico ou vise no seu uso uma utilização diferente. Na valorização os dados poderão ser de nível 1, 2 ou 3, mas não nos debruçaremos agora nesse tema.

Na maioria dos casos, o valor de mercado e o de justo valor são na sua conclusão numericamente idênticos, mas o justo valor e o valor de mercado não são sinónimos, embora possam ser equivalentes, pois a definição de maior e melhor utilização, de acordo com a IFRS 13, identifica apenas as utilizações que são legais na data da avaliação. A EVS 1 aborda a relação entre o Justo Valor, para efeitos de reporte financeiro, e o Valor de Mercado. Na abordagem de maior e melhor utilização, pode englobar usos que são legais ou que se esperam, à data da avaliação, que venham a poder ser legalizados.

As normas do SNC não trazem orientações diretas acerca da mensuração pelo Justo Valor sendo que as referências ao Justo Valor poderão ser encontradas em 2 normas do NCRF:

NCRF 7 para ativos fixos tangíveis onde o Justo Valor de terrenos e edifícios deve ser determinado a partir de provas com base no mercado, por relatório de avaliação que deverá ser realizada por avaliadores qualificados e independentes.

NCRF 11 no caso das propriedades de Investimento o Justo Valor será o preço pelo qual a propriedade poderá ser hipoteticamente trocada entre partes conhecedoras e dispostas a tal, numa transação em que não exista qualquer relacionamento entre as mesmas. O JV não deverá incluir um preço inflacionado ou deflacionado nem ser afetado por condições ou circunstâncias especiais (financiamentos atípicos, considerações ou concessões especiais)

O tema é complexo, por vezes aporta visões diferentes, e não se esgotaria aqui.

Fica para uma próxima ocasião uma reflexão sobre a valorização de imóveis para entidades financeiras (fundos e bancos em sede de boa garantia hipotecária) vs para outros fins (Ex valor de mercado para efeitos de partilhas).

 

Fontes: EVS, NCRF, OROC.

 

José Manuel Morgado

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